sexta-feira, 4 de junho de 2010

FORA DOS PLANOS

A verdade sobre aquele aborto é que o feto fora concebido fora de época e fora dos planos imediatos do casal em busca do sucesso. Agora, despesas calculadas, seria impossível ter um bebê. Quando a mãe dele deu palpite, ele prontamente respondeu que ela não estava na pele deles. Mal sabia que também ele fora concebido fora dos planos da mãe que nunca lhe cobrara por sua vinda, nem poderia, porque zigotos, embriões e fetos não decidem; quem decide são os pais e quem executa ou é um médico, ou alguma curiosa.

Assim, naquela casa concebeu-se um aborto como forma de livrar-se de um bebê concebido, mas ainda em forma de feto. Em poucos dias ela estava livre da maternidade indesejada; ele, da paternidade. Peitaram a Igreja. Se estavam em paz, foi outro capítulo da mesma história.

Fizeram-me lembrar aquela tribo de quase civilizados, cujos anciãos quase sábios, decretaram que preservariam a vida de quem já tivesse nascido, mas não a de quem estivesse por nascer ou por morrer. Assim, um decreto determinou-se que fossem mortos os homens e mulheres que matassem um bebê, a menos que ele tivesse vindo com algum grave defeito. Neste caso, seria um peso para a aldeia. Podia-se abortar, desde que os sábios decretassem que aquela gravidez fosse muito sofrida. O bebê nascido era intocável, a menos que nascesse com defeito. Os anciãos, se não servissem mais para nada, poderiam ser mortos. Aborto e eutanásia eram garantia de liberdade e progresso. Não queriam saber de nenhum peso morto.

Os critérios eram a utilidade ou inutilidade e o incômodo que aquela vida traria para os pais ou para a tribo, se os anciãos poderiam comer, beber e dormir sem ajuda de terceiros, ou se consumissem demasiado tempo, medicina e alimento. Não consideravam crime apressar a morte de um velhinho inútil, a de um enfermo irrecuperável, ou a de um feto indesejado.

Na pragmática aldeia tudo passava pela norma da mais valia. Para conforto espiritual de todos, os seus feiticeiros e sacerdotes decretaram que o ser humano veio a este mundo para ser feliz e alcançar o sucesso pessoal. Tudo o que prejudicasse o indivíduo ou o progresso da pequena aldeia deveria ser eliminado. Assim, por voto quase unânime, decretaram que a compaixão não era uma virtude. Adivinhem o nome da aldeia...

30/05/2010

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